Tapeçarias do Espraiado: uma arte que merece permanecer viva em Maricá  

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Um bairro charmoso e rural, localizado a poucos quilômetros do Centro de Maricá, o Espraiado abriga belezas naturais e guarda histórias de seus moradores que merecem ser contadas de geração em geração. É lá que vivem as tapeceiras, mulheres que se dedicam a manter viva a arte de uma técnica única e muito especial que recebeu o nome de “Ponto Brasileiro”, uma técnica um pouco parecida com o ponto de cruz, mas que utiliza um embaralhar de linhas em “x” que o torna diferente e especial, e que não existe em nenhum outro tipo de bordado.  

Criado na década de cinquenta pela marroquina, naturalizada brasileira, Madeleine Colaço, o “Ponto Brasileiro” ocupa posição de destaque na história da tapeçaria no Brasil e sua criadora é considerada um dos maiores nomes da tapeçaria nacional. Isso porque, além da técnica peculiar, as tapeçarias de Colaço integram aspectos típicos da cultura brasileira, principalmente, da região do Espraiado, lugar onde possuía casa e ensinava para as moradoras da região, todo seu conhecimento sobre bordado.  

Ilma Macedo, de 72 anos, aprendeu a técnica com ela, quando tinha apenas 9 anos de idade. “Aqui no Espraiado, a gente não tinha como ganhar dinheiro de jeito nenhum. Não podia trabalhar em casa de família, aí eu fui aprender para ganhar um dinheirinho, porque mesmo sendo pouco, já era alguma coisa. Então, eu chegava da escola e corria para aprender a arte da tapeçaria. Minhas irmãs e a minha mãe acabaram indo aprender também”, lembra Ilma, que montou um ateliê e desde 2003 lidera uma equipe de tapeceiras que resistem a todas as dificuldades para manter a arte da tapeçaria do Espraiado viva.  

“O mais importante para mim é espalhar a arte da cultura de Maricá, porque nasceu aqui, então a gente não quer deixar isso acabar, como aconteceu com a do Silvado. Lá tinha, mas não há mais ninguém que faça. Esse é um serviço cultural, não é artesanato, é uma obra de arte. Mas pelo que eu estou vendo ela deve acabar com o tempo”, lamenta.  

É que quando o projeto começou eram 11 tapeceiras, mas agora são apenas 3.  Tem ainda o De Miranda, que é responsável pelos desenhos e por auxiliar tia Ilma na coloração, e o João que é responsável pela venda das tapeçarias.  

Um trabalho totalmente artesanal 

Depois de cozida e colorida, a tela vai para uma tábua para ser pregada, é virada pelo avesso, passada a ferro quente e pano úmido, levando cerca de 15 dias em repetições desse processo, para que a lã estique um pouco mais. Posteriormente, é colocado um forro e feito o acabamento com a madeira, para que a pessoa possa pendurar a tela na parede. Tudo bem artesanal. Uma peça de um metro e meio, por exemplo, pode levar até cinco, seis meses para ficar pronta. Muitas delas, também utilizam o “rabo de rato”, um bordado feito com duas lãs, uma fina e uma grossa, ao mesmo tempo. Os valores variam de R$ 1600 à R$ 6000. Por isso, as vendas não são tão frequentes. 

“Já fiquei anos sem vender tapeçaria. Isso fez com que as tapeceiras fossem desistindo e arrumando outros empregos, porque a tapeçaria é toda manual, os produtos são caros, não tem como vender mais barato. Aí só tem dinheiro quando a gente vende a peça e divide o dinheiro. A pessoa que dá valor, normalmente, é porque conhece a história da tapeçaria. Eu, por muitos anos, também trabalhei em outras coisas, mas nunca abandonei a tapeçaria. Enquanto eu viver, vou continuar fazendo tapeçaria, mesmo que tenha que trabalhar sozinha, porque eu acho um trabalho muito bonito. Você não tem cópia. As peças são exclusivas. A gente pode até fazer composições dos desenhos, mas não repete eles. Nossa primeira remessa foi de frutas da região, depois passamos para flores e pássaros”, afirma tia Ilma.  

Deputada Zeidan tornou a arte da tapeçaria como patrimôminio imaterial do Estado do Rio de Janeiro 

Para que a arte da tapeçaria do Espraiado não chegue ao fim, a deputada estadual Zeidan criou o projeto de lei nº 3635/2017, que foi publicado em 01/10/2019, declarando patrimônio imaterial do Estado do Rio de Janeiro a confecção de tapeçarias do Espraiado de Maricá.  

Meses depois, a Prefeitura de Maricá declarou a Arte da Tapeçaria do Espraiado como Patrimônio Histórico, Artístico, Ambiental e Cultural do município. O tombamento visava estruturar ações de proteção e conservação da Arte da Tapeçaria, difundida e enraizada no bairro do Espraiado. Mas, infelizmente, com a pandemia, nenhuma ação pode ser colocada em prática.  

“A tapeçaria do Espraiado é uma arte que a gente não vê em qualquer lugar do mundo. Eu fiquei encantada quando cheguei em Maricá no final dos anos 90 e conheci esse trabalho. Em 2019 aprovei a lei que torna a tapeçaria do Espraiado em patrimônio imaterial do estado do Rio de Janeiro”, afirmou Zeidan, admiradora declarada da tapeçaria do Espraiado e do fortalecimento das raízes culturais da cidade.  

Atêlie voltou a abrir 

Com a volta do Espraiado de Portas Abertas, em abril, o ateliê de tia Ilma voltou a abrir suas portas para moradores e visitantes. Recentemente, o projeto que é administrado pela Secretaria de Turismo e acontece bimestralmente em dois dias da semana, no sábado e no domingo, é a oportunidade perfeita para todos que querem conhecer ou adquirir telas exclusivas das Tapeceiras do Espraiado.  

O acesso ao local é bem simples e sinalizado. Basta seguir as placas.  

O ateliê das Tapeceiras do Espraiado fica na Estrada Duas Águas nº 25, Espraiado – Maricá – RJ Cep: 24928-150. Ponto de referência: primeira rua à esquerda após a Escola Municipal do Espraiado, em frente ao bar do Djalma Botafoguense. 

Matéria por Elaine Nunes ( disponível na edição de agosto da Revista Maricá Já)

Fotos: Fernando Henrique Marins

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