O artesanato que transforma memórias em miniaturas

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Foto: Flavia Godinho

O artesanato tem o poder de eternizar histórias em formas, cores e texturas. É memória, identidade e, muitas vezes, recomeço. Em Maricá, esse poder toma forma nas mãos de Mônica França Couto de Souza, uma artesã que transformou desafios pessoais em inspiração para criar cenários em miniatura que carregam afeto, técnica e originalidade.

Foi durante a pandemia da Covid-19, que Mônica descobriu sua afinidade com a arte. A curiosidade virou paixão, a paixão, profissão. E assim nasceu uma produção que já conquistou admiradores dentro e fora da cidade. Moradora de Itaipuaçu desde 1998, Mônica chegou a Maricá em um momento difícil. Viúva, com um filho de apenas quatro anos, decidiu recomeçar do zero em um terreno que havia comprado com o marido. Com o dinheiro do décimo terceiro salário e das férias, construiu sozinha sua casa.

Foto: Flavia Godinho

Formada em Serviço Social, trabalhou por décadas na área até se aposentar. A arte só veio depois. “Comecei pintando as cadeiras de casa, depois fiz arte em telhas. Na pandemia, vendo vídeos de artesãs europeias no YouTube, descobri o universo das miniaturas e mergulhei de vez”, conta. Investiu em cursos, buscou referências e foi se especializando.

Hoje, suas obras reproduzem ambientes inteiros, salas, cozinhas, quartos, em espaços que variam entre 20 e 30 centímetros. Cada peça é feita com biscuit, uma massa moldável que leva dias para secar. A produção exige planejamento, cuidado e tempo.

“Não dá para fazer sob pressão. Tem que ser prazeroso. Se a demanda for muito grande, os clientes precisam esperar um pouco. Não dá pra trabalhar sob estresse”, afirma.

A artesã não depende exclusivamente do artesanato, tem outros ofícios, mas, mesmo sem essa dependência, conquistou uma clientela fiel, que entende que arte tem um tempo próprio. Uma única peça pode levar até 25 dias para ser concluída. Já os quadros menores podem ser produzidos dois por dia. Os valores dos ambientes em miniatura variam de R$ 180 a R$ 220, podendo mudar conforme o grau de complexidade.

Cada obra nasce da combinação entre criatividade e técnica. Mônica planeja o cenário mentalmente, adapta materiais e, muitas vezes, recicla embalagens. Tampas de creme dental, potes plásticos e outros itens descartáveis ganham nova vida em suas mãos.

“Trabalhar com miniaturas exige técnica e sensibilidade. Eu vejo uma ideia, adapto e faço acontecer.”

Além da produção sob encomenda, Mônica participa de feiras em Niterói e Maricá. Ela integra o coletivo Colmeia, que promove e fortalece a economia criativa local. Para conhecer ou encomendar suas peças, basta seguir no Instagram: @artes_franca

Mais do que um caminho pessoal, o artesanato representa um pilar de desenvolvimento social e econômico no Brasil. Segundo dados do Programa do Artesanato Brasileiro (PAB), órgão vinculado ao Governo Federal, cerca de 8,5 milhões de brasileiros atuam diretamente com esse ofício, presente em mais de 67% dos municípios do país. O setor movimenta entre R$ 50 a R$ 100 bilhões por ano, representando aproximadamente 3% do PIB nacional.

Além disso, o artesanato é reconhecido como impulsionador do turismo. De acordo com o Ministério do Turismo, a arte popular funciona como cartão de visita de muitos destinos, gerando renda e fortalecendo a identidade regional.

Em Maricá, cursos gratuitos, feiras culturais e apoio a grupos como o Colmeia vêm contribuindo para valorizar os artesãos da cidade. Ainda assim, Mônica acredita que é preciso avançar. “É importante dizer que só a feira não sustenta ninguém. O artesão precisa buscar parcerias com comércios, investir nas redes sociais, mostrar seu trabalho com orgulho.”

Apesar da leveza que suas obras transmitem, Mônica fala com seriedade sobre o ofício. “Existe um estigma de que o artesão é alguém que não teve outra opção. Eu fui para a feira para mostrar que é possível viver da arte, mas com técnica, estudo e profissionalismo.”

Ela destaca a importância da autoestima para quem vive da criação manual. “Não adianta reclamar que não vende se não está se especializando. Precisamos nos valorizar, inovar, criar nosso diferencial. Só assim conseguimos dar valor real às nossas peças.”

Para ela, a chave está na busca constante por aprimoramento. “Sempre estou fazendo cursos, buscando novidades, testando técnicas. É isso que me mantém em movimento. Minhas peças têm a minha energia nelas. São únicas.”

Com uma vida multifacetada e cheia de dedicação, Mônica consegue equilibrar seu ofício com outras responsabilidades. Além de artista plástica, ela é terapeuta integrativa, dona de casa, trabalha em uma empresa de material médico e cuida de cinco cachorros. Mesmo com uma rotina intensa, reserva seu tempo também para a criação de suas peças. “Minha vida é leve. E o artesanato faz parte dessa leveza”, resume.